A educação não pode mais ser planejada no contexto da "era de Gutemberg" - ou seja, dos tipos móveis e, portanto, do livro de papel. Na visão de Salete Toledo, especialista em educação e editora executiva da Edições SM, é preciso pensar o ensino em constante contato com as novas tecnologias e mídias. Para isso, os currículos escolares precisam assimilar as tecnologias, o que, na visão de Salete, demanda transformações nas intituições de ensino. "Nossa escola segue um modelo fechado. Precisamos de um ambiente onde possam circular mais informações, e essas informações estão fora dos muros da escola", diz a especialista, convidada a falar sobre o tema em um painel especial da Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que se encerra neste domingo. Confira a seguir os principais trechos da entrevista com ela.
No âmbito da educação, as novas tecnologia vêm sendo aplicadas de maneira efetiva no Brasil?
De maneira geral, o uso das mídias ainda não é efetivo. Existem algumas experiências em curso, mas são projetos incipientes e ainda há um longo caminho a ser percorrido. O projeto Um Computador por Aluno, por exemplo, é uma experiência efetiva. Também temos escolas – principalmente as particulares – que usam recursos para ministrar aula interativas, como as lousas digitais. Essa realidade, porém, ainda não está disponível para todos os estudantes e professores.
Uma recente pesquisa da Fundação Victor Civita mostrou que 72% dos entrevistados não se sentem seguros em utilizar computadores na escola. Como a senhora enxerga essa situação?
Ainda existe um investimento a ser feito na formação dos professores. Algumas universidades começam a tratar das novas tecnologias em seus currículos, mas esse ainda é um fenômeno muito recente. A dificuldade dos professores é fruto de falta de conhecimento.
Quais os maiores desafios em matéria de integração da tecnologia às escolas?
A primeira dificuldade está na escola. Nossa escola hoje é uma escola fechada e com horários determinados. Precisamos de um ambiente onde possam circular mais informações. E essa informações estão fora dos muros da escola. É preciso pensar também em uma mudança de currículo e da forma como encaramos a escola. O papel do professor mudou – ele já não é mais o detentor do conhecimento, mas apenas o mediador e precisa de orientação para isso. Essa é a grande reflexão que precisa ser feita: dentro dessa nova realidade, o que podemos fazer para ajudar esse professor a se aproximar dessa realidade tão viva que está fora da escola? Os desafios são variados, vão desde o material que o docente não possui até a própria visão do que a escola é. Esses são os grandes desafios – e eles são grandes mesmo!
A escola muitas vezes é descrita pelos alunos como cansativa e pouco atraente. A incorporação das novas tecnologias pode aumentar o interesse dos alunos pelos conteúdos?
Elas facilitam na medida em que são usadas de forma significativa. Se eu quiser apresentar um conteúdo de gramática usando o computador da mesma forma que faria sem a máquina, não teremos nenhum impacto, e o aluno terá, igualmente, pouco interesse. Porém, se eu usar uma tecnologia para fazer com que o aluno participe do conhecimento e construa junto com outros colegas conceitos, textos e projetos, isso pode ser interessante. O aluno já faz isso fora da escola, mas a escola ainda não se apropriou disso. Se as tecnologias forem usadas de um modo significativo para o aluno, com certeza ele vai se sentir participante, porque deixará de ser expectador e passará a ser colaborador. Não é mais possível pensar em uma educação na era de Gutemberg. Não temos mais livros apenas. Temos livros, filmes, celulares, laptops etc. Temos uma quantidade enorme de possibilidades.
Temos bons exemplos de professores que já incorporaram a tecnologia?
Conheço professores, jovens principalmente, que já tomaram essa iniciativa. Outro dia, um professor de inglês me contou que pede para seus alunos consultarem um dicionário no celular. Isso é proibido em outras escolas, mas ele conseguiu dar a isso uso significativo dentro da aula. Ele deu sentido à tecnologia. Muitas vezes, o aluno se perde no uso do computador e da internet na sala de aula porque falta sentido e foco na atividade.
Os celulares já são amplamente acessíveis e oferecem muitas possibilidades - fotos, filmagens, mensagens e mesmo a internet. Contudo, a maioria das escolas prefere proibi-los, assim como o uso das redes sociais e de outros aparatos. Essa é uma atitude correta?
Proibir o uso do celular é nadar contra a corrente. O jovem usa o celular da mesma forma que usa boné. Precisamos descobrir maneiras de usá-lo pedagogicamente. E ele pode ser uma ferramenta importante para trabalhar a questão do conhecimento colaborativo. Vivemos em uma era digital, já não é o conhecimento particular e individual que prevalece. E o celular é isso, é uma forma de transmitir conhecimento. Claro que algumas escolas proíbem porque não sabem o que fazer com o aparelho.
Em termos de tecnologias na educação, o que se deve evitar?
É preciso ter muito claro o objetivo de cada proposta ou tudo fica muito solto. Se o aluno tem foco, ele não vai usar a internet pra procurar outras coisas além daquilo que está sendo pedido. Se o professor der foco, os conhecimentos se tornam significativos. O que o professor deve evitar, então, é deixar tudo muito aberto e assim se distanciar do universo do aluno. O professor tem que se aproximar para conquistar o aluno.
Fonte: http://veja.abril.com.br
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